Desde
2007, quando conhecemos a Raimundo Balthazar da Silveira, uma das corridas mais
charmosas do calendário baiano, que o feriado de 1º de maio ganhou sempre
aquela expectativa boa de amanhecer na orla da Ribeira, para desfrutar de toda
beleza e poesia nos quase 08 quilômetros da prova organizada pela AVAB
(Associação de Veteranos de Atletismo da Bahia).
A partir
de meados de março deste ano, porém, o Coronavírus desembarcou no Brasil pra
valer, e os cancelamentos/adiamentos de provas começaram a pipocar. O
primeiro deles a nos rondar e atingir foi a suspensão da Corrida Cidade
de Aracaju, a decantada "São Silvestre do Nordeste".
Por se tratar de uma prova em que a comunidade baiana desce em peso para a capital sergipana, naqueles dias, a angústia pela espera da decisão (a maioria de nós torcia pela manutenção da data) foi amplamente compartilhada, e tema de assunto de praticamente todas as conversas.
Quando o
martelo foi batido, e um súbito desânimo geral podia ser sentido, uma luz
amarela se acendeu: era preciso buscar maneiras de manter a motivação em alta,
e "de quebra", os pensamentos numa faixa positiva. "O
Amanhã a Deus pertence".
Absolutamente treinados para os 24 km da Corrida de Aracaju, nosso primeira proposta, aceita
por toda turma que estava no dia-a-dia da preparação, foi fazer naquele final
de semana (data em que seria a competição) e aqui mesmo em Salvador, uma
meia-maratona em ritmo o mais próximo possível do competitivo. Ao final da
missão, a alegria era geral. Endorfinas não reparam muito em número de peito.
À medida
que a Covid-19 ia finalmente virando uma Pandemia Mundial (antes era só coisa
de gente de longe) e o assunto foi monopolizando todos os veículos de
comunicação, e aumentando os temores por aqui, cada um de nós foi buscando
aprender formas de viver este momento inusitado para nossa geração.
Assim que
foi anunciado o adiamento da Maratona de Porto Alegre ( principal prova do
semestre, para qual estávamos treinando, e que aconteceria no dia 31 deste
mês), a fim de manter um foco no condicionamento físico e mental, lançamos nova
proposta, Vamos treinar para simular na mesma data uma meia-maratona aqui mesmo
em Salvador?
Em nossa
opção de convivência em tempos de isolamento, reduzir o treino de 42 para 21
não era mero acaso. A intenção era tornar os treinos menos intenso, mais
curtos, e portanto, buscando fugir daquela janela, e conhecida sensação de
baixa de imunidade que costuma ocorrer imediatamente após aos treinos longos e
extenuantes.
A boa
informação nos foi ajudando a moldar hábitos, sobretudo de higiene. Hoje mesmo
ao me dirigir para casa após nossa "competição" me peguei pensando
que o carnaval fora outro dia, e mesmo já sabendo da situação na China, a gente
não podia se imaginar todos mascarados tão pouco tempo depois, e, finalmente
entendendo que a cena tão comum, e estranha para nós, nos países asiáticos,
sempre fora fruto da educação e do cuidado com o próximo.
Treinando
em média 4 vezes por semana, e buscando juntar (pero no mucho) a turma ao menos
num desses treinos, estamos vivendo um dia de cada vez. Aproveitando as horas
mortas, os lugares vazios ("As Dunas são uma academia ao ar livre,
presente de papai do céu," nunca foi tão verdade essa frase do Prof.
Carlinhos). ´Ninguém compartilha nada, ninguém dá carona. ninguém sequer faz
aquele cumprimento de pés que viralizou no começo da Pandemia, ninguém guarda
nada no veículo do outro.
Tempos de adaptação: Body Pump dentro de casa com sacos de feijão e arroz, cabo de vassoura etc. |
No fundo,
no fundo, nunca foi diferente, e nada garante nada. "O amanhã
a Deus pertence". Além disso, não somos melhores do que nenhum irmão, em
lugar algum do mundo que está sofrendo doente, ou pela perda de um ente
querido. Que seja feita sempre a vontade de Deus!
Com a
estratégia de saídas individuais e espaçadas entre si, por um minuto (medidas
de adaptação ao novo cenário), nossa versão da corrida "dos
Trabalhadores", que teve largada e chegada no Porto dos Mastros, novamente
teve o poder de espalhar gotas de suor e felicidade em nosso dia.
Axé!
"Desenlacemos
as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer
gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale
saber passar silenciosamente
E sem
desassossegos grandes...
...
... Nem
cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre
iria ter ao mar"
(trecho
de "Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio" - Ricardo Reis (F.
Pessoa).