II DOUBLE 84 MARATHON

O último domingo foi dia da Maratona do Rio, prova que participo desde 2009 e em que iria dodrar a distância pelo 2º ano consecutivo, correndo-a nos dois sentidos.

Confirmado que estava com Marcelino para repetir a dose, já estava muito feliz por ter arrastado junto para mais esta aventura o amigo Pataro, mas quando, através de contatos via facebook / telefone, pintou a possibilidade da adesão de outros ultramaratonistas, cresceu a expectativa por uma madrugada ainda mais divertida nos 42,2km do Aterro do Flamengo ao Recreio dos Bandeirantes.

Dentro do horário previsto estávamos todos reunidos no local combinado (pórtico de chegada da Maratona). Foram necessárias algumas apresentações para que soubéssemos quem era quem, já que muitos não se conheciam, entretanto, o objetivo e a paixão comuns em pouco tempo fizeram com que parecêssemos um velho grupo de amigos.

Além dos doubles (Cristiano Marcelino, Marcos Batista, Júlio Paul, Áureo Lavinas, Jefferson Pataro e eu), amigos e familiares da turma também madrugaram (será que chegaram a dormir?) para prestigiar nossa partida e, após os registros e preparativos para iniciarmos nossa viagem, sempre sob os atônitos e curiosos olhares dos trabalhadores da Organização da prova, às 2h e 50 minutos coube à esposa do Cris (Nilce Marcelino) a tarefa de soar a buzina, dando início à “II Double Marathon 84 Rio”.

A turma era bem experiente. Tacitamente ajustamos um ritmo que permitia a todos correr com tranquilidade e logo começou o bate-papo. Experientes e com currículos invejáveis, recheados de provas na casa dos 03 dígitos (parece que os mais "bobinhos" ali éramos eu e o amigo Pataro), é claro que tais provas foram os primeiros assuntos a virem à tona e, em meio a estórias deliciosas, atravessávamos a noite carioca.

Aquele grupo de 06 pessoas ruidosas, sorridentes, ensopadas e felizes correndo pela madrugada vestidos de coletes refletivos, mochilas e lanternas não passava despercebido em nenhum lugar. O pessoal que tava curtindo a noitada sempre gritava alguma coisa e houve até gente que largou seus companheiros na mesa do bar para, copo de cerveja na mão, acompanhar-nos por alguns metros.

Chegamos à Praia do Pepe (Largada da Meia-maratona) por volta das 5:00 da manhã e era incrível o número de corredores que já estavam ali para a largada que se daria apenas às 6:40. Algumas vezes ouvíamos alguém dizer "estes aí estão correndo 84", mas a grande maioria ficava com uma grande e divertida cara de interrogação sem conseguir entender o que estávamos fazendo.

Quando alcançamos o Recreio dos Bandeirantes a maioria dos maratonistas já estava alinhada para a largada da Maratona.

Ao passarmos pelo pórtico o Mestre de Cerimônia chamou atenção do povo para o fato de estar chegando o pessoal que estava fazendo 84km e  fomos recebidos com aplausos.

Agradecemos o incentivo, mas seguimos adiante porque ainda faltava dar uma volta de 03km para encerrar a primeira parte da Double.

Júlio Paul, Cristiano Marcelino, Jefferson Pataro, Marcos Batista, eu e Áureo Lavinas

Ao final de 04h29, faltando menos de 10 minutos para a largada, abraçados, festejamos a conquista dos primeiros 42,2km. Agora o nosso corre-corre era para deixar as coisas no guarda-volumes e comer o tão desejado pão com coca-cola na padaria para largar novamente antes que retirassem o tapete de cronometragem.

* * *

A MARATONA

As necessidades eram parecidas (banheiro, guarda-volumes, padaria), mas cada um tinha sua prioridade e nosso reencontro foi marcado para o pórtico principal.

Assim que cheguei lá Marcelino foi logo me dizendo que tinha visto "os caras" largando. Na confusão, Pataro, Áureo e Júlio, na dúvida se ainda estávamos por ali ou não, se mandaram atrás da galera.

O relógio marcava 22 minutos de prova quando, num contra fluxo incrível (boa parte dos maratonistas já havia feito o retorno e passava novamente no pórtico), Batista, eu e Marcelino acionamos mais uma vez nossos cronômetros.

Passando novamente no Pórtico (KM 3)

Durante a noite já havíamos acertado que, para não forçar a barra para ninguém, não precisávamos ficar todos juntos na maratona da volta.

Não demorou muito para cruzarmos com nossos companheiros de Double que já retornavam e agora tinham os narizes apontados na direção do Aterro do Flamengo. Com toda aquela chuva e ventania contra que estávamos pegando, fazer logo o retorno era o que mais desejávamos para ganhar aquela ajuda extra da natureza.

Com a intenção de alcançar o amigo Pataro, lentamente fui me distanciando da dupla Cris e Batista. A dianteira, porém, era enorme e de repente eu já nem estava com uns nem alcançava os outros e foi aí que comecei a viver realmente a Maratona do Rio 2012.

O atraso da saída e o ritmo que estava imprimindo propiciavam-me ver bem de perto um outro lado da rainha das provas: a Superação.

Era incrível o número de pessoas que antes mesmo dos 10km já travava uma enorme luta para seguir na prova. Favorecido pelo vento, ia avançando rapidamente e, ao mesmo tempo que cumprimentava os corredores, ia imaginando os heroicos motivos pessoais que traziam aquelas pessoas àquele desafio.

Por volta do km 10, reconhecendo à frente o Júlio Paul, mudei a voz gritando-lhe: "Eu já lhe vi correndo por aqui hoje". O sorriso no rosto denunciava que meu sotaque não havia passado despercebido.

Pensei em dar um tempo com o companheiro, mas vi que 200 metros à frente estavam Pataro e Áureo, então, perguntando se estava tudo bem, deixei o Júlio, que buscando incentivar-me dizia: "vai buscar!".

Quando alcancei os líderes da Double eles estavam indo tão entrosados que, após trocarmos uma meia dúzia de palavras, resolvi manter o ritmo e seguir adiante. O amigo estava em boa companhia.

Com 2 horas e 06 minutos passava o pórtico da meia maratona (63k da Double) e fui notando que finalmente começava a passar mais tempo correndo lado a lado com o mesmo grupo de pessoas.

Na subida do Joá isso fiou ainda mais evidente; todas as vezes que diminuía um pouco o ritmo para bater foto reconhecia rostos de pessoas que havia ultrapassado há muito tempo e que não esperava mais reencontrar.

A subida da Niemeyer se aproximava. Sabia que lá no alto encontraria o km 28 e comecei a pesar se eu iria ou não treinar subir um quilômetro andando para ver quanto renderia em relação às pessoas que estavam indo agora na mesma balada. Em Urubici havia visto muita gente usando essa técnica, mas lá na prova não tive coragem de fazer teste.

Esse pensamento me angustiava um pouco. Nunca andei numa prova e estava me sentindo bem, mas como esses 84k fazem parte do treinamento para as 24h de Campinas em Novembro (onde irremediavelmente há que se andar em alguns momentos), e considerando que eu já estava completando 70km, resolvi me permitir.

Entretanto, o morro ia passando e nada de eu ter coragem de começar a andar, até que, falando para mim mesmo que era "pelo bem da ciência" (rs) desacelerei para iniciar uma caminhada. Até parece mentira. Senta que lá vem estória.

Acredito que não se tinham passado nem 15 segundos quando ouvi de um corredor que passava ao meu lado:

- Não pode desistir não, amigo.

Vaidoso, confesso, respondi-lhe:

- É por opção que estou caminhando.

E emendei:

- Estou fazendo 84km.

Ao que ele retrucou:

- Eu sei, vi em seu blog, Roberto.

Surpreso, não pensei duas vezes e gritei:

- Não me sinto à vontade com esse negócio não, vou pegar carona com você. 

E evidentemente contente com o reconhecimento reiniciei a corrida para acompanhá-lo. Meu treino durara menos de 1 minuto.

Ainda na Niemeyer afastei-me um pouco para tentar fazer uma foto e, ao retornar, imprimir um ritmo mais forte; acabei perdendo de vista o querido leitor, mas o melhor da Maratona ainda estava por vir.

Por volta do km 34, já no Leblon, vi um atleta no sentido contrário com uma bela medalha no pescoço e chamei atenção disso para o corredor que ia ao meu lado. Ele concordou com o meu comentário, mas - não me lembro bem exatamente como foi - falou algo a respeito de uma meia maratona em Salvador.

Quando ouvi-lhe falando de uma prova em Salvador, fui logo dizendo que era daquela cidade. Imediatamente, como resposta, ouvi um "eu também!". Logo descobrimos que não só morávamos na mesma cidade, como também no mesmo bairro.

A partir daí o converseiro começou. Everton estava em sua primeira maratona, mas nem parecia, dada a tranquilidade com que seguia. Eu havia passado mais de três horas correndo sozinho, o papo estava bom e o ritmo completamente adequado ao meu momento na prova. Não tive dúvidas, fecharia a prova com meu vizinho.

Everton no Aterro

Correndo pela Triação, o Everton toda hora recebia o cumprimento de alguém e fazia questão de dizer que tinha encontrado um personal running.

Paulatinamente íamos engolindo os quilômetros. Em Copacabana vi a euforia em seu rosto quando alcançou o companheiro de treino, única pessoa além dele em sua assessoria esportiva que estava enfrentando os 42,2km.

Euforia, medo, dúvida, certeza, dúvida novamente, felicidade... A rainha das provas estava conquistando mais um pra seu reino. Com direito a sprint final, fechamos a Maratona (juro que por alguns momentos nem lembrava que eu estava completando 84,4 km) e, emocionados, comemoramos nossa parceria. Ele agradecendo demais a minha presença naqueles últimos 08 quilômetros de sua primeira maratona e eu querendo que ele entendesse que, a despeito da minha "experiência", a companhia dele havia sido de importância igual ou superior. 


Voltando à Double... Cruzara a linha com 8h56min50. A chuva e o vento continuavam fortes.

Aos poucos os companheiros foram chegando. Por conta de compromissos pessoais alguns precisaram retirar-se mais cedo. 

O sucesso completo da Double só se deu quando avistei Pataro e Áureo (os últimos a chegar) cruzando a linha de chegada; vinham lado a lado, tal como quando havia passado por eles no quilômetro 10, com a diferença de que agora, irremediavelmente, haviam se tornado amigos. Coisas deste nosso esporte. 

Obrigado Deus!

Rafinha e Luan e seus robôs

Assista os últimos metros do desafio

-12 de julho- Há 07 anos ganhei de Deus este presente