A primeira vez que ouvi falar do Caminho da Paz foi quando recebi o convite do Prof. André Araújo, Presidente da ATEC-BA (Associação dos Treinadores de Corrida de Rua da Bahia) e proprietário da Assessoria de Corrida Corpus Vitalle.
Mal
começara a ouvir suas explicações sobre o Caminho, entre surpreso e descrente, o
interrompi:
- Inicia-se
onde?!!!
- Na
cidade de Amargosa, respondeu-me ele.
Meus
pais vivem em Amargosa, minha mãe é daquela cidade, não conseguia acreditar que
ali seria ponto de partida para uma jornada de peregrinação, sobretudo porque
há dois anos venho flertando com o Caminho da Fé, que se inicia em Minas Gerais e
termina na Catedral Basílica de Nossa Senhora de Aparecida em São Paulo.
Saber
que o caminho baiano era pensado / desenvolvido aos moldes do famoso Caminho de
Santiago (com direito a passaporte / carimbos / certificado), que habita o imaginário
dos meus desejos desde que na adolescência o conheci através do mais famoso
livro de Paulo Coelho, apressou meu sim, muito antes de, mais relaxado, ouvir
finalmente os detalhes:
“O Caminho da Paz é uma caminhada de 127km de extensão, iniciando na Cidade de Amargosa, no Estado da Bahia, com chegada no “Projeto Semente” – um ponto de Luz nas montanhas do Vale do Jiquiriçá, em Ubaíra. É o primeiro do gênero no Nordeste do Brasil.”
“O Caminho da Paz é uma caminhada de 127km de extensão, iniciando na Cidade de Amargosa, no Estado da Bahia, com chegada no “Projeto Semente” – um ponto de Luz nas montanhas do Vale do Jiquiriçá, em Ubaíra. É o primeiro do gênero no Nordeste do Brasil.”
O primeiro passo antes de iniciar a peregrinação é adquirir a credencial e todas as informações necessárias (nomes de pousadas, contatos em cada ponto de chegada, etc) na Pousada do Bosque em Amargosa, primeiro ponto de apoio do Caminho.
O
percurso é todo marcado com setas amarelas pintadas em estacas, postes, pedras,
cancelas, árvores pelos 08 peregrinos que criaram o Caminho da Paz no ano de
2003 (Antônio Presídio, Maria de Lourdes, José Antônio, Wellington Muller,
Roberto, Lourdinha, Jussara e Benedito). Em seu traçado original, media 165km,
mas a partir de 2011 passou a ter “apenas” os atuais 127km e está concebido
para ser feito em seis dias, assim divididos os trechos:
127Km pelas
trilhas do
CAMINHO DA PAZ
Sequência de Dias /
Percurso / Km
|
||
1° dia
|
Amargosa
ao Alto da Lagoinha |
25Km
|
2° dia
|
Alto da Lagoinha
ao Morrinho de São José ao Alto da Lagoinha |
13Km
|
3° dia
|
Alto da Lagoinha
a Mutuípe |
17Km
|
4° dia
|
Mutuípe
a Jiquiriçá |
26Km
|
5° dia
|
Jiquiriçá
a Ubaíra |
27Km
|
6° dia
|
Ubaíra
ao Projeto Semente |
19Km
|
O
que eu só fui ficar sabendo no final é que nossa expedição teria algo de
diferente, apesar de não inusitado. O convite do Prof. André era para que
fizéssemos o caminho de bike, percorrendo dois trechos por dia, reduzindo-se
pela metade a quantidade necessária de dias para completá-lo e, desta forma podendo
ser feito no período do feriado da Páscoa.
Consultei
a tia Lalá, que ficou toda empolgada com a viagem e confirmei nossa presença no
Caminho.
***
Quinta-Feira
Após
executar no CT mais uma vez o famigerado treino de circuitos (que alterna tiros
de 5 e 10km com 5’
de agachamento) colocamos as bikes no carro e pegamos estrada para irmos à casa
dos meus pais.
Amigo na praça é sempre melhor que dinheiro no bolso. Para facilitar meu retorno a Salvador no Domingo de Páscoa, deixamos o carro com Louro e lhe pedimos que o levasse ao Projeto Semente (final do Caminho da Paz) entre a sexta e o domingo de manhã.
O
grupo teria 08 ciclistas-peregrinos, mas o início da viagem começaria apenas na
sexta-feira à tarde e somente a tia Lalá e eu havíamos chegado em Amargosa um
dia antes. A primeira coisa que providenciamos foi a compra das nossas
credencias (R$ 40,00) na Pousada do Bosque. Agora eu tinha a prova concreta de que
aquilo existia em minha cidade (rs).
Aliás,
não encontrei por lá uma pessoa sequer que soubesse da existência do Caminho da
Paz.
Outra
coisa que fizemos na quinta foi um reconhecimento dos 12km iniciais do primeiro
trecho e o que vimos foi bem pior do que imaginávamos. O negócio era dormir
cedo para economizar energia para o dia seguinte.
Meus pais ("Seu" Osvaldo e D. Floripes) posando com as bikes antes de iniciar a viagem |
SEXTA-FEIRA SANTA
- 1º trecho
Às 16 horas reunimos o Grupo – André Araújo, Ângela Pelosi, Marcelo Del Pozo, Songeli, tia Lalá e eu (a Beatriz Giesta e Zé Carlos partiriam no sábado com a intenção de nos alcançar no Caminho, o que, infelizmente, concretizar-se-ia apenas no Domingo no Projeto Semente, ponto final da jornada).
Às 16 horas reunimos o Grupo – André Araújo, Ângela Pelosi, Marcelo Del Pozo, Songeli, tia Lalá e eu (a Beatriz Giesta e Zé Carlos partiriam no sábado com a intenção de nos alcançar no Caminho, o que, infelizmente, concretizar-se-ia apenas no Domingo no Projeto Semente, ponto final da jornada).
Marcelo, Songeli, tia Lalá, eu, André e Ângela |
A
interação do grupo foi quase que imediata, logo estaríamos enfrentando as pirambeiras
do Caminho e a cumplicidade só faria aumentar.
A
noite nos colheu na estrada e, faróis acesos, viajando o mais próximo possível
que nos permitia a prudência, pudemos comprovar que o troço das marcações das
setas (reacendidas recentemente pelos Profs. André Araújo e Ângela Pelosi)
funciona muito bem.
Perto
das 09 horas da noite, cansados mas felizes com a primeira vitória, chegamos a
nosso destino (Alto da Lagoinha), onde fomos magnificamente recebidos pela
simpaticíssima D. Damiana. Banhados e alimentados (não necessariamente nesta
ordem), só nos restava desfrutar das convidativas camas que, ansiosas, nos
aguardavam.
SÁBADO DE ALELUIA
- 2º Trecho
Logo que vi os mapas do Caminho da Paz, decidi-me que faria o segundo trecho no trote, já que ele era o único em que se saía e voltava ao mesmo ponto, dispensando assim a bagagem e as “magrelas”. Assim que lancei a ideia, para meu contentamento (coisa de ciclistas-peregrinos-corredores), a aceitação foi geral.
Logo que vi os mapas do Caminho da Paz, decidi-me que faria o segundo trecho no trote, já que ele era o único em que se saía e voltava ao mesmo ponto, dispensando assim a bagagem e as “magrelas”. Assim que lancei a ideia, para meu contentamento (coisa de ciclistas-peregrinos-corredores), a aceitação foi geral.
Trote até o Morrinho com o dia amanhecendo |
Por volta das 6 horas partimos para (o que só depois iria saber) a etapa mais fácil e bonita do percurso, apesar de tratar-se também do ponto mais alto de nossa jornada.
Sem
“miar”, como sugeriu um descrente nativo que nos viu sair correndo do Alto da
Lagoinha, chegamos ao Morrinho de São José bem tranquilos e o que nos fez
perder o fôlego mesmo foi a vista que se tem lá do alto.
Com
a chave que nos foi entregue por D. Damiana, abrimos a Igrejinha postada à
beira do morro para conhecer seu interior e, além de reservar uns minutinhos para
contemplação silenciosa, cumprimos, também, o ritual de depositar uma pedra no
monte que fica ao lado dela.
meditando no |Morro |
Fica
a dica: na descida do Morrinho (mais ou menos com 700 metros ) deve-se
ficar atento à primeira entrada à direita.
- 3º trecho
Por
volta das 10 horas da manhã deixamos o Alto da Lagoinha e logo de cara uma
enorme subida dava a ideia do que enfrentaríamos.
Prontos para encarar o 3º trecho - Alto da Lagoinha/Mutuípe |
O Caminho nos dava suas lições.
avistando Mutuípe |
- 4º trecho
Sempre
por estradas de barro e belíssimas (apesar de duras) paisagens, por volta das
16 horas deixamos Mutuípe e partimos em busca do nosso próximo destino, a
cidade de Jiquiriçá, e mais uma vez a noite nos surpreendeu na estrada.
Saindo para Jiquiriçá |
Cantando,
conversando, empurrando bicicletas morro acima, desviando de buracos, aos
poucos alcançamos nosso último objetivo do dia.
DOMINGO DE PÁSCOA
- 5º Trecho
Saindo de Jiquiriçá |
A
primeira etapa do dia nos levaria até a cidade de Ubaíra e, mantendo sua
característica de muita beleza (e sobe e desce) o Caminho mais uma vez exigiu o
melhor de nossa condição ciclo-peregrina.
Com
uma parada para reabastecimento chegamos finalmente à estrada principal e
exatamente no momento em que seguíamos por ela para entrar em Ubaíra,
coincidência das coincidências, encontramo-nos na Rodovia com nosso amigo Louro
que seguia com parentes e amigos (em dois carros) para o Projeto Semente, onde
deixariam o nosso carro e, claro, que aproveitariam para conhecer.
Exatamente
no momento em que ele nos avistou estava folgando o pneu da bike da tia Lalá
para soltar a corrente que travara dada a combinação inadequada de coroa grande
x catraca mega ranger e a primeira coisa que gritei foi um “vai-te embora,
antes que a Tia Lalá esmoreça e resolva entrar no carro”.
Chegando em Ubaíra - um dos poucos trechos de asfalto do Caminho |
Entre
carimbos, reabastecimentos e outras providências, em Ubaíra gastamos uma hora e
exatamente às 10:30 partimos para o último trecho da viagem.
Os
primeiros 10km foram de uma facilidade impressionante, já estávamos todos
desconfiados: Cadê a tal serra? Andando um pouco adiante, sempre na intenção de
adicionar técnica à pedalada da tia Lalá a fim de minorar seu sofrimento,
novamente me perdi no caminho.
Por
1,5km estivemos fora da rota, somente quando fizemos meia-volta é que nos demos
conta de que havíamos interpretado errado a direção a que nos remetia uma seta
pintada numa estaca.
Na
verdade ela nos mandava, sem cerimônia, deixar a estrada e subir uma montanha.
Assustados com o tamanho da encrenca e ainda sem certeza de que era aquilo
mesmo que tínhamos que fazer, começamos a escalada.
Quando
chegamos ao ponto mais alto avistamos uma cena impressionantemente bela. Lá
embaixo podíamos ver o casal André e Ângela com suas bikes “apeadas” e, defronte
a eles, dezenas de bois harmoniosamente alinhados os contemplavam.
Enquanto
descíamos é que começamos a entender a situação, na verdade o que estava
acontecendo não tinha nada de harmonioso, aqueles bois horrendos estavam
acuando nossos amigos e, por sorte, além de uma cancela que os separava, o
sangue de vaqueiro dos antepassados do Prof. André começou a circular em suas
veias e ele já estava botando a boiada para correr.
Dali
por diante, a “estrada” era no meio dos pastos. Outras boiadas nos seguiram e
fomos “salvos” por outras cancelas.
Como
era de se esperar, finalmente chegou a hora de descer a montanha do outro lado.
Nossos amigos, que já haviam estado no Projeto Semente em outras ocasiões
começaram a reconhecer que estávamos muito perto. Estávamos sim. Logo
encontramos uma marca de 500m até o final. Hora de cantar, sorrir, chorar,
gritar e até de cair (Prof. André mandou uma “rabeada” apoteótica e quase beija
o chão exatamente na frente do Projeto Semente rs), toda e qualquer forma de
manifestação era válida e merecida.
Infelizmente,
Louro e sua família (a quem devo muito), já haviam ido embora deixando lá as
chaves do carro, onde enfiei as bikes antes mesmo de conhecer o Projeto.
Projeto Semente |
Apesar
de ter consciência de que aquilo não era o mais importante, o momento de
recebermos os “canudos” por haver completado a peregrinação ciclística foi
muito especial.
Trilhar
o Caminho, acima de tudo, é manter vivo o sonho daqueles oito primeiros heróis
que o criaram e a quem devemos muita gratidão pela experiência que nos
proporcionam ainda hoje.
hora de voltar para Salvador |
Axé!
P.S. ESTOU VIAJANDO E AINDA TEMOS ALGUMAS FOTOS PARA SUBIR - CONEXÃO NÃO ESTÁ AJUDANDO MUITO.
Roberto que aos poucos recuperando seus movimentos em sua andada diária no CT |
16 KM AREIA/BARRO - com Chico, Pataro e Vitório |
AMARGOSA/ALTO DA LAGOINHA
ALTO DA LAGOINHA/MORRINHO DE SÃO JOSÉ/ALTO DA LAGOINHA
Com D. Damiana |
ALTO DA LAGOINHA/MUTUÍPE
as setas do caminho |
MUTUÍPE/JIQUIRIÇÁ
JIQUIRIÇÁ/UBAÍRA
morador curtindo a vista |
UBAÍRA/PROJETO SEMENTE
Maria Presídio emitindo nosso certificado após nos receber muito carinhosamente |
PROJETO SEMENTE
Roberto muito bacana este passeio. Já tinha ouvido falar deste percurso através da Rosi. Ela fez correndo. Mas acredito que durante dias. Parabéns a todo grupo. Pedalando é muito gostoso, dá para curtir bastante.
ResponderExcluirAbração e até mais
Este comentário foi removido pelo autor.
ExcluirValeu, Dart!
ExcluirNeste caminho, tenho quase certeza, no trote seria mais fácil que pedalando!
Abraços!
Amigo,
ResponderExcluirFico muito feliz, por conhecer esta aventura atraves do seu depoimento, e tambem por saber que um dos fundadores Wellington Muller é um grande amigo meu, e Antonio Presidio um conhecido. Parabens, e vamos ver a possibilidade de fazermos este percurso a pé...
Grande abraco
Bruno Fraga
Bruno,
ExcluirFiz o caminho o tempo todo imaginando realmente em fazê-lo correndo (com amigos) noutro momento.
Abraços!
Muito feliz por saber que amigos maravilhosos como vocês participaram de mais uma aventura emocionante! Vendo as paisagens e a sua emocionante narrativa me senti participando com vocês. "Aventura é um milhão de novos começos, movidos pelo desafio, sempre novo de viver e fazer todo sonho brilhar."
ResponderExcluirForte Abraço da Amiga Lu Bastos !!!
Lu,
ResponderExcluirQue bom que tenha se sentindo lá, mas espero mesmo voltar ao Caminho e desejo que você esteja nele.
Abraços!
Que máximo Roberto. Uma aventura muito especial e agregadora ao lado de pessoas tão especiais.
ResponderExcluirOrgulhosa de vocês.
Cássia.
Foi realmente o maior desafio que já vivenciei, mas a gratidão a vocês e ao Caminho por estar ali foi tão grande quanto!
ResponderExcluirSinto-me especialmente grata a você, que foi incrível durante todo o tempo e me ajudou muito.
Estamos! e em Paz!
Roberto,
ResponderExcluirComo sempre, aventura da boa e narrada de forma espetacular. Que maravilha de feriado.
Grande abraço!
Gilmar
muito bom! curti essas paisagem lindas! faz muito bem, parabéns a todos! vanuza lins.
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