quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

VICE CAMPEÃO NAS 12 HORAS NIGTH RUN - ETAPA EXÉRCITO BRASILEIRO 38º BI

3ª Ponte, o belo cenário das 12 h night run

12 HORAS NIGHT RUN

Ao amanhecer do último domingo, após 12 horas ininterruptas de corrida na Ultramaratona Night Run, prova que encerra o calendário capixaba de corrida, e que apesar do qualificado time que se alinhou para uma acirrada disputa, tem aquele gostoso clima de confraternização, uma frase teimava em martelar minha cabeça: Valeu a pena.


O sucesso de organização da prova, não chegou a ser uma surpresa, afinal era uma festa de corredor para corredores, e tanto o Hudson, quanto o Júlio Paul da Multiesportiva, demonstrando saber o que realmente importa para quem está numa competição desta magnitude, e mesclando com muita propriedade, amor ao esporte e  profissionalismo, deram show de atenção a todos atletas e apoiadores que estiveram reunidos  no 33º Batalhão de Infantaria do Exército em Vila Velha.
Júlio Paul - Organizador da parte técnica das 12H Night Run

Voltando no tempo...

A ESCOLHA DA PROVA

No começo de novembro, desde que percebemos (Pataro e eu) que por questões financeiras,  infelizmente, teríamos que desistir da BR 135, comecamos a buscar uma prova que a “substituísse”.

Repassando o calendário de ultras, encontramos a prova capixaba, prevista para meados de dezembro, um período  que combinava muito bem com nosso recente ajuste de planos para 2019.

Com Roberta no dia seguinte 
O primeiro contato para saber se já havia confirmação de que a corrida iria acontecer foi com a prima Roberta V.S, que mora em Vitória. E a Roberta, não só demonstrou todo seu contagiante entusiasmo pela prova, como foi logo dizendo: “Se você vier, eu serei seu apoio”. 

Pronto estava decidido.

O VOO PARA VITÓRIA

Foto feita desde o avião, e sem me dar conta, já registrava o local onde iria se desenrolar as 12h
Às 11 do sábado, deixamos Salvador com destino a Vitória. 

Manoel, que havia pensado em estrear sem maior compromisso nesse tipo de prova, findou por perder a data da inscrição, e dessa forma, uma vez mais estava indo para ser nosso “anjo da guarda”. O que viria a ser providencial e decisivo, já que a Roberta, após nos dar todo suporte para montar a estratégia de hidratação/alimentação, por motivo de força maior, não iria mais poder passar a noite no Exército.

O KIT E AS HORAS PRÉ PROVA

Atravessamos a terceira ponte, e um pouco antes das 18 horas chegamos ao nosso destino.

Chegando no campo de batalha

O 38º Batalhão de Infantaria de Vila Velha estava em festa. Enquanto nos dirigiamos à fila para pegar nosso kit, sugeri a Manoel que aproveitasse a luz do dia, para montar a barraca que havíamos trazido desde Salvador para funcionar como “QG” do Salvador Pró-Maratona.

E  logo alguns bons reencontros (amigos e adversários) foram acontecendo.

Manoel montando a barraca

Dando a costumeira e rápida bisbilhotada na lista solo masculino, notei que havia uns 100 convocados, número considerável para uma prova de 12h, e tive certeza que a parada não ia ser nada fácil.

A PROVA

12 horas correndo num circuito que media aproximadamente 1,45 km, deixa a gente meio tonto por vários dias, rs.


3ª Ponte e sua iluminação

Talvez seja ainda resquício do cansaço da noite “perdida”, mas olhando de cá do futuro, percebo como se alguns flashes iluminassem esta ou aquela cena, em meio ao lento deslizar da escura eternidade.

Tanto melhor, me dirá o leitor mais ajuizado, “pelo menos isso não vai demorar muito”.

Então passemos às lembranças...


Veio a execução do Hino Nacional, vieram os apertos de mão, os abraços, e os mútuos desejos de boa prova, e pontualmente às 20h, começamos nossa longa viagem dentro da noite.


Expectativa geral para a largada
Exatamente como fizéramos na Paraíba, Pataro e eu começamos a prova, lado a lado. O ritmo era de bate papo e descontração e porque não dizer, também de despedida de 2018. Começávamos a descobrir, sem pressa alguma, os detalhes de nossa volta.


Estivemos naquele ritmo por cerca de uma hora até que uma necessidade de pit-stop do amigo, fez com que nos separássemos.



Além dos Atletas Solos Masculinos e Femininos Civis, existiam as modalidades Solo Militar e as equipes de revezamento, que sempre traz mais movimento, tornando mais divertida a prova para quem vai corrê-la inteira.

Como de costume nesse modelo de prova, de hora em hora, a organização divulgava a classificação dos 05 primeiros de cada modalidade. Havia recomendado expressamente a Manoel que não me contasse nada sobre classificação... até que eu lhe pedisse informações...

Traçara algumas metas, e levava comigo a crença de que se as cumprisse, fatalmente terminaria bem classificado, e com alguma chance de subir no pódio principal, única opção de premiação da corrida.


Apesar de ser um circuito relativamente pequeno, e do resultado ser anunciado no sistema de som, adianto-lhes que em momento algum ouvi o resultado, nem mesmo quando já desejava sabê-lo.

Por volta das 03 horas de prova, percebi que começava a passar uma galera que havia saído mais forte, entre eles nada mais, nada menos que o atual vice-campeão da BR 135, o capixaba Leonardo Seabra, atleta da Ultra Sports.

Foi mais ou menos por essa mesma hora, que ultrapassei um atleta solo, que não havia percebido ainda (é incrível como a gente pode rodar num mesmo espaço e levar horas sem se encontrar). Senti que o rapaz, ao perceber que eu também era solo, forçou-se a aumentar o ritmo. 

Fingindo por alguns minutos que não estava percebendo a “marcação”, não resisti a ser eu mesmo, rs, virei de lado e entabulei uma conversa:

“- Poxa a gente está na mesma batida”.

Ao que o rapaz retrucou, dizendo-me que estava ali aprendendo um pouquinho.

Tá querendo me amolecer, rs”. (Essa frase eu só pensei, rs), mas sorri para o jovem corredor.

“ - Incomodo?”.

“Absolutamente. Nestas provas precisamos de parceria para passar o tempo”.

A conversa começou a rolar, e pouco tempo depois, descobriria que estava correndo ao lado do Talles Cicillioti, campeão da edição de 2017 com 83 voltas.

Um outro momento que me marcou muito na prova, foi quando percebi que o atleta a ser ultrapassado era o Carlos Gusmão. A gente tá ali querendo aproveitar o bom momento, pois sabe que depois precisará administrar os maus, mas não há como simplesmente ultrapassar um ídolo, como se nada estivesse acontecendo.


Sabia que o Gusmão não viera para dar seu 100%, pois além de ter finalizado em outubro a Spartathlon, ultramaratona de 246 quilômetros, que ocorre entre as cidades gregas de Atenas e Esparta, vinha de uma semana cheia de corridas beneficentes, estava ali nas 12 horas também como Professor da forte equipe Ultra Sports.

correndo ao lado de Carlos Gusmão
Queria aproveitar para saber coisas sobre a “Caminho do Rosa”, prova de 250 km, já vencida pelo amigo, e que por prometer forte emoções para os fãs de Guimarães, figura com grande destaque em minha lista de desejos.

Então já sabe né? Reduzi o ritmo e usufruí por algum tempo da boa energia do amigo, até que numa passagem pela tenda da sua equipe, ele avisou que ia dar uma parada para beber algo.

As horas iam se passando, e Manoel sempre no maior cuidado com a nossa programação hidríca/alimentícia, ia ficando visivelmente agoniado para me contar sobre a classificação.

“Quer saber, agora?”.

“Não”. Gritei-lhe, divertindo-me, enquanto seguia meu caminho.

É óbvio que já tinha uma noção que estava entre os primeiros. Havia completado os primeiros 42 km em 3h e 50 minutos e muita gente me dirigia palavras de incentivo. Entretanto queria adiar ao máximo, a angústia da competição com o outro. A luta comigo mesmo já era bastante significativa.


Foi por volta das 3 horas da manhã (07 horas de prova), que ao passar mais uma vez pelo pórtico, que o Gusmão me avisou:

- Você tá na mesma volta do primeiro!

Pronto, acabara o sossego, rs.

Ao passar na frente da barraca de Manoel, tratei de avisá-lo que já sabia que estava em segundo lugar e, claro, como não poderia deixar de ser, quis logo saber quem era o primeiro.

“O primeiro lugar está de verde”.

O tom esverdeado predominava na camisa oficial da prova, e muitos a estavam usando. Dali por diante, a cada ultrapassagem, dava uma olhada de esguelha pra ver se o corredor levava o numeral 17 no peito (não disse que o sossego se acabara?) e, foram muitas, até que eu me recordasse de um corredor que havia aberto uma dianteira de mim no começo da noite.

Carlos André (sósia do amigo  João Paulo, rs?) após concluir sua última volta
O tal corredor lembrava em muito um amigo de Salvador, tanto na aparência física, quanto na forma de correr. Dali por diante, não tive mais dúvida, concentrei em minha cadência e poupei uma cacetada de viradas de cabeças, rs.

Uma meia hora depois, o corredor surgiu finalmente em meu campo de visão. Mudo e o mais discretamente possível (quanta mudança, rs) fiz a ultrapassagem.

Não obstante faltar cerca de 4h e meia para o final da prova, a partir dali comecei a sonhar com a vitória. a liderança, porém, durou apenas do km 77 ao 80. Ao final de duas voltas, novamente o atleta da RR Trainer, Carlos André, voltava a tomar a dianteira da Night Run.



Dali até o fim seria uma brincadeira de gato e rato. Houve até um momento em que ele surgiu, já com pinta que iria colocar uma volta, e eu sem cerimônias acenei, gritando-lhe que podia chegar, rs.

Por volta do km 90 dei minha primeira andada. Havia tempo vinha me prometendo que faria uma breve caminhada quando atingisse o 100 km, não resistindo mais, presentei-me com algo em torno de 300 metros, e receando perder o ritmo de todo, faltando ainda 3 horas de prova, voltei logo a praticar algo parecido com corrida.


O ritmo das voltas estava pelo menos dois minutos a mais em relação ao começo da prova, mas absolutamente dentro de um padrão.

Quando estava com 97 rodados, reencontrei Pataro, e pedi-lhe que corresse ali por perto, para me dar uma força até eu completar o simbólico Km 100.

Após a divulgação da lista das 10 horas, comecei a perguntar a Manoel quem era, e a que distância estava o terceiro lugar (mau sinal, rs), e obtive como resposta que era um “coroa” de nº 5, que havia dado uma parada mais que estava correndo muito forte agora, e naquele momento, estava com três voltas a menos (cerca de 4,5 km de distância).

Na perseguição ao primeiro colocado, sabíamos (Manoel é um apoio que faz o serviço completo, rs) que o Carlos estava sempre andando na parte de trás do circuito, expediente que eu também já passara a usar. Estávamos moídos.

Foi quando o dia começou a amanhecer que começou a ser escrita a parte mais incrível desta edição das 12 horas do Exército. 


Passando em frente a nossa barraquinha azul.

Semelhante a alguém que acabara de acordar, Alonso Boasquevisque, esse era o nome do coroa que vinha em terceiro lugar, (e não por acaso, já fora vencedor de uma edição daquela prova), ultrapassou-me baixando para duas voltas a distância entre nós.

O velho Alonso, ainda de madrugada, ao lado de Eduardo Calixto
O que me ganhou de cara no velho Alonso, foi sua franqueza enquanto passava por mim:

“Tá difícil, mas vou tentar tirar”.

Já impressionado com o ritmo que ele conseguia desenvolver, e sem poder sequer imaginar o que viria a acontecer, devolvi-lhe uma frase simpática:

Se você conseguir, estará em boas mãos o segundo lugar”.

Pouco tempo depois, Alonso já reaparecia no retrovisor. Cheguei a dizer a Manoel que ele não só iria me passar, como daquele jeito, ainda iria vencer a prova.



Usando muitas vezes Pataro como referência, tentava me afastar do perigo, mas Alonso, tal qual seu xará espanhol, engolia o asfalto e as curvas a toda velocidade.

Quis resistir, mas na parcial das onze horas, a distância entre a gente baixara para apenas uma volta.

Completamente, esgotado, precisava tentar defender aquele segundo lugar, mas não estava conseguindo nem de longe acompanhar o ritmo do Alonso Boasquevisque.

Aquela hora parecia querer durar mais que todas as outras. O Sol queimava meus olhos que estavam morrendo de vontade de se fechar. E lá na frente, um “velhinho” de 60 anos, dando voltas em ritmo de Ferrari.


Fui fazendo o melhor que podia, mas quase que resignado com a perda em breve do segundo posto, então de repente, notei que depois de algumas olhadas para trás, nosso velocista enfim deu uma diminuída no ritmo, botou a mão no rosto e começou a andar.

Reuni forças e tratei de alcançá-lo para novamente deixá-lo duas voltas atrás de mim.

De passagem por ele, como em todas as outras ocasiões, ainda trocamos breve conversa. Segundo ele não dava mais. Ufa, pensei eu. Enquanto repetia-lhe que se perdesse o segundo lugar, não poderia imaginar melhor adversário.

Pensam que acabou? Aliás, por falar nisso, aproveito para pedir desculpas ao leitor que acreditou que esse texto seria rapidinho, rs, mas a novela ainda não atingira o seu clímax...

Mal passra a frente, toda vez que chegava a um local donde podia me assegurar que o velho Alonso vinha caminhando, por meu turno também começava a caminhar. Sabia que  não estava muito atrás do primeiro colocado, mas vencer a prova nem tava mais me passando pela cabeça.

Faltando cerca de 20 minutos para o término da prova (graças a Manoel que havia me avisado), olhei para trás, e era incrível o que os meus olhos viam, tal qual uma Fênix, Alonso ressurgia em ritmo alucinadamente inacreditável e passou por mim feito um bólido, antes de eu completar a volta que eu, erroneamente, julgara que seria a última.

Alonso, impressionantemente voando sobre o asfalto, a pouco minutos do fim da prova.
Senti qual era a cartada final do meu astuto adversário. Contrariando todos os prognósticos de tempo para uma volta àquela altura do campeonato, ele tinha em mente conseguir cruzar o pórtico mais uma vez antes das 12 horas completas.

Fui rápido no reagir, e como que movidos pelo mesmo combustível, apertei o passo. Quando cheguei no pórtico, o relógio marcava 11h e 51 minutos de prova, e dando aquela olhada para trás para conferir se eu havia aberto nova volta, lá na frente, voava o incrível Alonso.


Há muito tempo que meu giro estava na casa dos 10 minutos, mas agora eu tinha menos de 9’ para validar outra volta.

Corri...

O relógio foi para casa de 5h 10. Como somos fortes, não é mesmo?. 

Em dado momento, já convencido que havia encaixado o ritmo, mudei a tela do Garmim para o modo relógio: Eram 07:56 da manha e ainda tinha muito chão para cobrir.

Continuei acelerando, ao mesmo tempo que rezava não ver o “ponteiro” passar para 57. Mesmo “secando” o cronômetro, vi aparecer o temido número. Só para que tenham noção, aquela foi a terceira volta mais rápida de toda noite.

Enfim, juntos, rs.
Restava pouco tempo para a festa acabar, mas comecei a ter certeza que iria conseguir, e com uma felicidade iluminando o rosto cansado da vigília, ia sorrindo, feliz comigo mesmo pela força mental demonstrada e doido para poder abraçar em breve o menino Alonso que tornara ainda mais especial aquela noite.


Como Garmim marcando 114,6 km (novo recorde pessoal em 12 horas) e com a marca de 82 voltas, o mesmo número de campeão, e somente uma a mais que o terceiro lugar, às 07h 58, agradecendo a Deus sempre, cruzaria o pórtico pela última vez naquele dia.

Até a próxima!


Pódio Geral - 1º Carlos André , 2º Roberto Encarnação, 3º Alonso, 4ºLessandro (Bsb) e 5º Carlos 


Antes


e depois


Obrigado, Professor Marcelo Augusti





  

Diana Bellon que venceu a prova feminina com 83 voltas (uma a mais que o campeão masculino)


Comemorando com parte da família capixaba

Com Fátima Encarnação



Regenerando em Camburi na segunda de manhã

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

100K ULTRAMARATONA DA SERRA - UMA VITÓRIA DA AMIZADE


Ultramaratona da Serra

Tão logo ouvi falar desta prova de 100km na Paraíba, com largada em João Pessoa  e  chegada em Campina Grande, tive certeza de que um dia iria vivenciá-la.

Afinal, as lembranças destas duas cidades que trazia e ainda trago comigo, além de excelentes não são poucas, sendo as mais recentes a experiência de casar o início da preparação para o Desafio 42k Serra de Itabaiana (prova que viria a vencer) com o inigualável São João de Campina Grande em 2016, e uma deliciosa pedalada entre Maceió e João Pessoa em dezembro daquele mesmo ano.

E foi em meio a um dos treinos com a galera do Salvador Pró-Maratona, comentando que gostaria de fazer a prova este ano, mas que provavelmente não poderia ser de forma muito competitiva, pois teria que fazê-la no estilo survivor, ou seja, carregando mochila de hidratação, parando em posto de gasolina para repor água, etc., etc., que o amigo Manoel Lima (que já estivera na prova em quinteto no ano passado) surpreendeu-me com a seguinte exclamação: "Beto, se você quiser eu posso  ser seu apoio".

Aquela frase parecia um raio de luz entrando pela casa. No mesmo instante um sorriso brotava em meu rosto, e mal sabíamos que ali estava sendo plantada a semente da vitória deste final de semana.

Acostumada às soluções logísticas, a cabeça logo imaginava a possibilidade de incluir Gil e uma bike no Projeto, uma vez que seríamos dois a precisar de suporte na competição, pois, para variar, Pataro, o velho parceiro de "guerras", topara participar da prova.

22 de novembro - quinta-feira


Com uma bicicleta amarrada ao transbike, acompanhado de Manoel e Gil, por volta das 5h30 demos início à nossa viagem de carro entre as cidades de Salvador e João Pessoa.

Com Manoel (o rei da selfie) e Gil , a caminho de João Pessoa
A ideia era chegar o mais cedo possível, uns para descansar, outros, os mais festeiros, nem tanto (quem conhece a turma sabe de quem estou falando, rs), mas sabendo que no outro dia seria aniversário do Monstro Benfazejo Gil, como singela homenagem, em vez do caminho mais curto, tomamos o caminho mais turístico, para que ele, ainda que de passagem, curtisse um pouco mais a viagem.


Então foi litoral ao máximo, passagem em todas as capitais do caminho (Aracaju, Maceió e Recife) e outras mumunhas mais.
Em Pajuçara
Os amigos, aliás, merecem mesmo todas as festas para eles, afinal de contas, dispuseram-se a viajar para ajudar a mim e a Pataro, que por compromisso no trabalho, chegaria de avião somente na tarde do dia seguinte.

Preciso afirmar, reafirmar e agradecer sempre muito a Deus por tudo que me cerca, e esses três amigos tão especiais só podem mesmo ser entendidos como presente Divino.

Uma hora, enfim, chegamos ao nosso destino...


23 de novembro - sexta-feira


Acordar cedinho para o famoso treino de soltura pré-prova nunca fora tão justificado, afinal de contas havíamos dirigido cerca de 1.000km no dia anterior, e de quebra, é claro, não poderíamos deixar passar em branco o aniversário de Gil.
treino de soltura na orla de João Pessoa
Depois de um belo café da manhã restava descansar ao máximo e esperar... esperar a hora de dar início aos preparativos da hidratação, a chegada de Pataro, a busca do kit, o congresso técnico, a noite passar para dar início a brincadeira no amanhecer do próximo dia.

24 de novembro – sábado


Pela lista de inscritos, sabia que, entre outras feras, estariam presentes o carioca radicado na Paraíba, Fábio Spá, campeão da edição passada da Ultramaratona da Serra,  atual campeão também dos 80km da Natal / Touros, vice-campeão da Extremo-Sul Ultramarathon (só para ficar em algumas de suas conquistas) e o também carioca, o fortíssimo Renê Romualdo, atual campeão do 100km do frio, com impressionantes 9:24:30, no sentido ladeira acima, Caruaru / Garanhuns.
No Farol de Cabo Branco 
Confesso que não havia saído de Salvador com a confiança em alta, mas o clima de brincadeiras pré-prova foi me deixando mais tranquilo, e na chegada ao ponto de concentração da largada, sentia-me um tantinho menos “leão na jaula”.


Correr competitivamente sempre traz alguma carga de tensão, mas uma vaidade que assumo é o desejo de poder completar a missão, seja lá em que posição/tempo for.  De toda sorte, precisamos todos ter a consciência de que somos felizardos só de poder estar ali reunidos para tentar algo tão fantástico, como bem dizia uma propaganda a respeito dos 100k.




Após 7 semanas de preparação específica, estava chegando a hora de botar à prova "a estratégia de treino agressiva" proposta pelo Prof. Marcelo Augusti para essa competição.

Pontualmente às 4h50 foi dada a largada dos solo (algumas categorias largariam ainda às 5h da manhã) e como combinado, na mesma batida, lá fomos eu e Pataro.

Por mais que  insistisse que voltassem ao hotel para tomar café da manhã, pois poderíamos ir nos virando sozinhos pelas próximas duas horas, nossa dupla de apoio, bike atada ao fundo do carro, também deu início ao seu belo trabalho.




A CORRIDA



Aproveitando o frescor da manhã e usando como referência algumas pessoas do decateto (onde cada um faz 10 km) conseguimos (Pataro e eu) fazer 12,5 km na primeira hora de corrida.

Os primeiros 08 km no ritmo da excelente corredora que liderava o decateto


Lá na frente, cada vez mais se distanciando, dois corredores seguiam fortes. Haviam passado direto no primeiro PC, e já no clima da prova, pedi aos meninos que fossem averiguar se se tratavam de corredores solo (como são chamados os atletas que estavam encarando os 100km full) e nos trouxessem notícias.


Sem muita convicção Gil e Manoel voltaram dizendo que apenas um deles era nosso adversário direto.


A marca da meia maratona foi alcançada com 01h e 44 minutos e por volta do km 28, Pataro e eu começamos a nos separar.

Quase na passagem do quarto PC, recebi uma ultrapassagem de um rapazinho que estava usando a numeração com o padrão dos solo o que fez toda a equipe Salvador Pró-Maratona julgar que havia caído para terceiro lugar.

Consolei os valorosos staffs, lembrando-lhes que a gente só pode correr a nossa própria corrida, e apesar de estarmos razoavelmente longe do fim ainda, a passagem dos 42km com 3h e 40, indicava-me que tudo estava dentro do script.

Como que para confirmar nossas palavras, poucos minutos depois começava a surgir em nosso campo de visão o antigo líder da prova, que, diga-se de passagem, não sei exatamente em que altura, já havia aberto 2km de dianteira.

Renê Romualdo que só seria alcançado no  km 46 e infelizmente precisou parar no km 60

Por volta do km 46, reassumimos a vice-liderança. Dentro de mim até sorria, será que estava realmente com a “maldição” de vice, que alguns amigos zoando tem me atribuído ultimamente? (rs) Tri vice-campeão seguido dos 100km do Frio (corrida em moldes parecidos com a prova que estava fazendo), vice no X Terra de Barra Grande no ano passado, vice na Beach Cross em fevereiro deste ano...

Foi logo depois disso que Gil e Manoel resolveram que já era o momento de separar as  estruturas de hidratação, Gil na bike com Pataro e Manoel comigo no carro. Percebi de imediato, mas concentrado na missão, e confiando no julgamento dos nossos anjos, sequer comentei.

A metade da prova foi alcançada com 4h e 15 minutos, e justamente na passagem pelo 5º PC comecei a ouvir dos corredores e seu pessoal de apoio que estávamos liderando. Alguém chegou a dizer que o rapaz que ia na frente entrara no carro e havia desistido.

Com a dúvida rondando a cabeça chegamos ao km 60, e lá pedi a Manoel para se informar do tempo de passagem do rapaz no PC 50 e PC 60, para ver se estava com um padrão aceitável.

Não foi o caso desta vez, mas infelizmente, neste modelo de prova, em que o corredor tem apoio de carro, diversas vezes ocorrem coisas estranhas, e durante o Congresso Técnico, um dos atletas perguntando ao organizador o que havia sido feito para coibir esta lamentável prática, havia chamado a atenção que no ano anterior houve “corredor” que foi filmado entrando em carro.

Adianto inclusive que a prova feminina deste ano, teve seu brilho empanado, porque houve muita confusão na premiação, justamente por causa de acusações desse gênero.

Manoel voltou com a resposta de que o rapaz não havia passado no km 60, mas que havia surgido um corredor com um número diferente. O pessoal da anotação parecia não estar muito familiarizado com o que estava fazendo, mas começamos a pensar que, apesar da numeração no padrão dos solo, tratava-se de uma dupla. 



Dupla masculina campeã - Jefferson da Costa Diniz (o atleta que havia me passado) e Matheus Isaac, representantes do 31º Batalhão de Infantaria Motorizado - Campina Grande

Por mais que se buscasse informações nos PCs, certeza mesmo de que se tratava de uma dupla, pasmem, só fomos ter no km 90.

De toda sorte, buscando tranquilizar o super Manoel, dizia-lhe que independente do que estava acontecendo, o negócio era seguir concentrados em nossa corrida, que vinha se mantendo estável, apenas com a quebra de ritmo natural pelo passar das horas e acumular dos quilômetros.

E como havia trabalho em que se concentrar (rs).  Os intervalos de parada iam ficando cada vez mais curtos, seguir os horários do plano de alimentação/hidratação que o havia entregue na noite anterior, tirar fotos, correr ao lado enquanto me entregava algum item ou jogar água gelada na cabeça, correr de volta para o carro, etc.

Cada vez mais ouvia rumores de que estava liderando a prova, portanto o negócio passava a ter uma tensão maior, e já que havíamos chegado àquela condição de brigar pela vitória, o negocia era procurar fazer o máximo de esforço, até para tentar retribuir tanta dedicação de nossa dupla de apoio, e em especial, naquela segunda metade da prova, do amigo Manoel.

“Quero chegar com o campeão”. Sempre divertido já dizia ele na noite anterior. É claro que não era a única condição para sermos felizes, mas se a chance se apresentava...


Lá pelo km 64, Gil reapareceu com a bike, para repor itens em seu isopor e retornar ao auxílio a Pataro, que segundo ele estava chegando no km 50.


Com aproximadamente 6h e meia de prova ia me aproximando do km 70, lembrando das palavras do amigo Luiz Eugênio, sabia que pouco depois iria subir a Serra do Bacamarte, ponto mais íngreme da corrida.


Momentos antes um corredor de quinteto passava por mim, dizendo que as ladeiras de verdade começariam depois daquela baixada, para eu ter cuidado com aquela parte final. Era exatamente por isso que vinha me policiando o tempo todo, nenhuma caminhada, mesmo naqueles momentos de baixa, tão comuns em prova de longa distância.

E foi exatamente na Serra do Bacamarte que arrisquei dar minha primeira caminhada, algo do tipo 45 segundos, e sempre receoso de travar, voltei para meu trote hiper lento (há caminhadas por aí mais velozes). Até chegar ao topo, fiz isso mais umas duas ou três vezes.


Vencida a serra, tratei de botar olho no relógio para manter a velocidade pelo menos perto dos 10km/h.


A essa altura da corrida, um componente fazia toda a diferença: o apoio dos atletas e de suas equipes. Cada vez mais ia encontrando gente que fazia questão de demonstrar admiração pelo fato de encontrar um corredor solo tão adiantado.


“Meu amigo, você é solo? Parabéns, irmão! Olha aqui (mostrando os pelos do braço) estou todo arrepiado”, ouvi de um dos mais entusiastas. Parabéns para todos nós! respondi-lhe.


Turma de Queimadas na Paraíba - vice-campeões com a Dupla  Almir e Roberto e os seus apoios Adilson e Rodrigo

A galera que estava no apoio dava uma força enorme, oferecia água, água de coco, rapadura e muitas, muitas mesmo, palavras de incentivo. Eu, sem me fazer de rogado, ia aceitando e agradecendo a tudo. 

Alcançamos o quilômetro 84, marca da segunda maratona, com 8h e 10 minutos, o que indicava que havia gasto 50 minutos a mais em relação aos primeiros 42 km. A constatação contudo não era tão desanimadora, na cabeça, seguia firme no propósito de manter-me correndo pelo menos até o km 90, onde colocaria em prática um velho e conhecido plano.

Chegando ali, pedi a Manoel que me desse uma garrafa de água a mais e que ficasse parado por 13 minutos ou até passar o atleta que vinha em segundo lugar. "O que ocorrer primeiro", gritei-lhe ainda enquanto me afastava.

Comparo este momento àqueles em que o piloto de fórmula 1 tem que rodar o mais forte que puder antes de fazer o pit-stop, Portanto, tratei de "apertar o passo", algo em torno do 6'30/km, rezando para que o amigo só me encontrasse uns 2,5km à frente, porque isso já indicaria que ninguém havia aparecido em 13 minutos.

E foi o que aconteceu...

Pouco antes de chegar no km 93, reencontraria um animado Manoel que já começava a ensaiar um grito de vitória. 


Na passagem pelo km 95, a bela Campina já se apresentava gigante à minha frente. A emoção de estar prestes a concluir a missão, após tão difíceis dias que vinha enfrentando, aos poucos ia me envolvendo. Os olhos marejavam, mas precisava manter o foco e seguir em frente.

As palavras de apoio, as buzinadas festivas, os oferecimentos de ajuda, iam se multiplicando à medida que a cidade ia se tornando mais próxima.

De repente, ouvi Manoel avisando que ia buscar um local lá em cima e que tão logo eu chegasse à rótula, faltaria apenas pegar a esquerda e seguir numa reta até o Parque das Crianças, local de chegada. 

Ao ver a derradeira ladeira à minha frente, mais extensa que íngreme, resolvi dar uma caminhada. Fui subindo aos poucos, controlando a emoção, e aí, bem no meio dela, veio o susto (rs).

Ao olhar para trás vi um atleta correndo com um padrão muito parecido com o de quem está fazendo longa distância. Definitivamente não parecia ser alguém de um decateto ou quinteto.

Meus amigos, sabe aquela frase "Na hora do medo..."?

Disparei à toda, disparei mesmo. Subi desesperado o resto da ladeira. Na rótula dei uma espiada e mesmo sem ver ninguém, apertei mais ainda o ritmo, reencontrando a dupla de Queimadas que havia me deixado para trás na ladeira e estava tendo o Rodrigo como pacer. 

Ritmo do km 99
Nesta hora passei até Manoel que estava de carro no trânsito (rs). E mesmo ele dizendo "não vem ninguém, não vem ninguém!", na dúvida, pedi licença aos dois corredores e fui embora. 

Quando finalmente vi o Parque das Crianças, ainda dei uma última olhada para trás. E foi com grande alívio que pude constatar que o portal de chegada estava logo depois da entrada.


Missão cumprida, Manoel!

Agora sim, sob aplausos e grande alarido de um certo staff, o sistema de som confirmava: éramos campeões da II Ultramaratona da Serra 100k.



Logo mais partiríamos para localizar Gil e Pataro, encontrando-os em bom ritmo no km 90, e o astral da dupla, que já estava bom, aumentou ainda mais com a notícia de nossa vitória.

Pataro 

Ficaríamos com eles até o final, porém o regulamento da prova previa que a premiação dar-se-ia à medida que chegassem os três primeiros colocados de cada seguimento, desta forma, passamos mais suprimentos para o isopor da bike de apoio e tocamos de volta para a área de chegada, onde mais tarde, extasiados pela missão cumprida, voltaríamos todos a nos reencontrar.

Foto gentilmente cedida pelo Dr. Fábio Spá na Moutain Do Costão do Santinho  5º lugar geral em 2017  (
o chegarmos no Parque das Crianças, fomos informados que o pódio ainda não estava completo, mas infelizmente o vice-campeão (Fábio Spá), por ter plantão numa cidade distante de Campina Grande, precisou ir embora sem aguardar a cerimônia de premiação.


Algum tempo depois, visivelmente emocionados, o simpático atleta Renato Veloso e sua equipe, com quem tive o prazer de trocar ideias, adentrava o Parque das Crianças como terceiro lugar.

No pódio ao lado do Prof. Renato da Equipe ZKSport
Queria fugir da questão idade, mas é tanto atleta me chamando de Senhor (grrrr!), que preciso tocar no assunto (rs). 

Vencer uma prova aos 50 anos tem um sabor muito especial. É como disse ao amigo na "preleção" durante a viagem de carro para o ponto de largada:
"Pataro, vamos dar nosso máximo enquanto ainda podemos, pois a gente tá ficando velho, daqui a pouco tudo vai começar a cair, e nossa maior preocupação nem serão os tempos" (rs).


A gente aprende com o passar dos anos que ninguém consegue nada sozinho, portanto eu sei o quanto devo esse resultado a cada uma das pessoas que se dispuseram a me acompanhar nos dias de preparação, a cada um que teve um pensamento positivo em relação à nossa jornada, ao trabalho árduo de Manoel e Gil durante a prova, ao velho amigo Pataro, parceiro de tantas e tantas preparações/competições, às orientações do amigo e nutricionista Jhonatan Merlo, a todos meus professores de Pilates, etc, etc. e a Deus, sempre.



Por fim, gostaria de dedicar esta nossa singela vitória ao quiropraxista Dr. Douglas Hora, que, como diria minha mãe, abaixo de Deus foi quem me mostrou que era possível seguir em frente, não obstante as quatro hérnias de disco detectadas há 11 anos, e, claro, ao Prof. Marcelo Augusti, o Cara que sempre tem um olhar positivo mesmo naqueles dias em que os treinos não saem exatamente como ele receitou.

Até a próxima!











Pirambu/SE