terça-feira, 11 de dezembro de 2012

INDO PARA EXU: DIA 07 - SERRITA / EXU (80KM)



“Minha vida é andar por este país pra ver se um dia descanso feliz, guardando as recordações das terras por onde passei, andando pelos sertões, e dos amigos que lá deixei”.

O caminho é pra ser curtido. Amo estar na estrada, estar em movimento e vivi plenamente estes 07 dias de viagem, mas chegar é insuperável.   Nenhuma das dificuldades enfrentadas durante a jornada resiste ao mágico filtro que se instala no momento que se atinge o objetivo. 

Estamos em Exu e Viva ao Rei do Baião!

Às 6:00 da manhã comecei a deixar a cidade de Serrita.  Tenho certeza que não foi falta de reza dos amigos, mas antes mesmo de passar pelo portal de saída da cidade notei que o pneu dianteiro estava furado.  Enquanto pensava o que iria fazer reparei que estava em frente a uma borracharia e fui para a primeira troca de câmara-de-ar do dia.

Saindo de Serrita (1ª tentativa)
Improvisando um adaptador (perdi o meu ontem), depois que armei a jante o borracheiro conseguiu encher o pneu e em meia hora estava de volta à estrada.

Ainda tinha 80km para percorrer e o detalhe era que agora, além do adaptador também não tinha mais câmara inteira. A estrada recapeada e irregular só fazia piorar a situação.

Não tinha pedalado nem 10km quando o pneu tornou a furar. Meio desnorteado comecei a andar pra frente empurrando a bicicleta. Não queria voltar, não queria desistir depois de chegar tão perto.

No meio da estrada tinha uma casa...

Bati palmas e em seguida dei o prefixo do sertão: “Louvado Seja Nosso Senhor Jesus Cristo”. Um homem assomou à porta e, após explicar-lhe que estava viajando de bicicleta, fui logo pedindo para deixa-la ali enquanto retornava a Serrita com a jante dianteira.  Além da permissão recebi (e aceitei) sua oferta de carona.

Ainda tinha cartuchos a queimar: remendos a frio.

Por incrível que pareça nunca usei “cola fria”. Sempre trago câmaras novas de socorro e geralmente aproveito o tempo livre nas cidades para mandar colar. O problema é que estas tripas que a gente coloca no aro 700 não aceitam cola quente.

De volta à Borracharia que fica no posto onde havia dormido, pedi ao seu proprietário que fizesse a colagem a frio. O homem balançou a cabeça dizendo que não tinha experiência com aquilo, mas meteu a mão na massa.

Enquanto ele trabalhava fui acordar a tia Lalá para que me levasse de volta ao local onde havia deixado a bike.  Ela, que já me imaginava longe, não entendeu nada, mas foi se aprontar.

Ao retornar à Borracharia notei que apesar da boa vontade o homem não estava se saindo bem com a experiência. A primeira colagem havia soltado e a segunda não estava com uma cara muito confiável.

Seja o que Deus quiser! Pneu novamente cheio e montado entrei no carro com a Titia para ir até a bike, mas enquanto manobrava, quase que totalmente abatido, notei que novamente o pneu havia se esvaziado.

“– Eu perguntei a Deus do céu ai, por que tamanha judiação”.

Nem percebi a hora, mas graças a Deus a tia Lalá ouviu um homem dizendo que lá no centro da cidade havia um borracheiro que tinha mais experiência com bicicleta.

Eu ainda tinha um remendo. Esperança renovada, fomos mais uma vez à luta.

Quando recebi das mãos do senhor Dedé o pneu montado, ainda que vazio por não ter lá o tal do adaptador, tive a sensação de que dessa vez ia dar certo.

Nova partida
 Após retornar ao velho borracheiro para encher o pneu, seguir para o local onde estava a bike, montar e recomeçar a viagem o relógio já passava das 09 da manhã.

A tia Lalá retornou a Serrita para arrumar as malas e tomar café-da-manhã.

20km à frente os milagres começaram a aparecer. A estrada, que dava pintas de ser daquele jeito até lá, se transformara num tapete.  Já havia percebido que mesmo no baticum do recapeamento que vinha enfrentando o ritmo estava bom e o tráfego bem tranquilo.

Às 10:30 da manhã, minha incrível e dedicada companheira passou trazendo um delicioso combustível em forma de pão com queijo coalho e coca-cola e já encontrou um cicloturista muito mais confiante. Disse-lhe que fosse tranquila para Exu e que provavelmente nos encontraríamos antes das 13 horas.


A despeito do avançado das horas, aquele ritmo estava sendo o melhor dos últimos dias, entretanto a coisa ainda ia esquentar mais.

“Quando olhei a terra ardendo” notei que atrás de mim vinha um trator puxando uma carroça. Sua velocidade oscilando entre 30 e 40 km/h era perfeita para eu pegar um bom vácuo e adiantar a viagem.


 Quando li o nome “Asa Branca” na carroça entendi que aquilo só poderia ter sido um presente de Deus, sugerido pelo velho Lua. 


Durante muitos quilômetros segui colado ao fundo da Asa Branca, mas numa ladeira acabei perdendo seu vácuo e ela “bateu asas e voou”.

Pouquíssimo tempo depois cheguei à cidade de Moreilândia e resolvi dar uma rápida parada para pegar água e tomar um suco. Só quando encostei no bar é que reparei que a Asa Branca estava estacionada próxima e que seus condutor e passageiro estavam lá dentro.

Logo que entrei os caras foram falando pro povo do bar: “Nunca vi um cara pedalar assim. Nesta bicicleta ele vinha colado atrás e às vezes emparelhava”.

Aceitando o convite para partilhar da cajuína que bebiam, completamente empolgado e às pressas para retornar logo à estrada, expliquei para o pessoal que vinha desde Salvador, os perrengues daquela manhã e, claro, mais uma vez precisei responder que não se tratava de promessa, que sou apaixonado pelo Gonzagão.

Houve um engraçado que disse:
“– Eu também sou, mas não tenho coragem nem de fazer esses 30km daqui pra lá”.

O tratorista me disse que estava indo para Exu e sugeriu que eu jogasse minha bike em cima. Agradeci o convite e disse a ele que partiria logo para tentar pegar novo vácuo caso ele me ultrapassasse.

Não deu outra. Os caras chegaram novamente. Concentrei-me decidido a ir com eles até Exu. Acredito que neste segundo tempo fizemos pelo menos 20km juntos. Era meio dia e meia quando ele acenou que iria entrar para uma roça e mostrou-me a cidade de Exu a menos de 2km.


Quando cheguei ao Triângulo Meu Araripe minha emoção também era tripla: chegava com saúde e paz ao fim de mais um projeto; a persistência me presenteara com um dos melhores dias de pedalada da minha vida; estava na cidade do Rei do Baião, do Xote, do Xaxado, da Poesia...



Graças a Deus!



Lua, Lala e Ciço

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

INDO PARA EXU: DIA 6 - CABROBÓ / SERRITA (93KM)



Apesar de não ser um dia de quilometragem alta, chegar a Serrita não foi nada fácil.

Às 5:30 da manhã, Cabrobó já ia se tornando apenas uma imagem no retrovisor da minha bike.  

De volta à 116, assim que tomei a direção de Salgueiro pressenti que o relevo da estrada ia mudar e não deu outra, nos 60km seguintes o sobe e desce foi constante. Para aumentar a complicação o trânsito de carretas estava pior que nos dias anteriores.

O cobertor para este frio foi ter sintonizado uma rádio com a programação inteiramente dedicada ao Rei do Baião. Assim, convenhamos, fica bem mais fácil.

No plano original o destino de hoje seria Salgueiro, entretanto a vontade de me aproximar mais de Exu-Pe me fez decidir por prosseguir um pouco mais.

Por telefone avisei à tia Lalá que seguiria para almoçar em Serrita, dando-lhe as coordenadas de como chegar àquela cidade e orientando-lhe que só deixasse o Hotel (em Cabrobó) depois das 11 horas.

Pouco depois de deixar Salgueiro tive um pneu furado. Sob o sol forte do sertão nordestino, o pit stop em nada é parecido com o que vemos nas corridas de Fórmula 1. Retirar as bagagens, virar a bike, desarmar jante, armar, encher... lá se foi um montão de segundos. rs

De volta à pista, já estava na estrada para Serrita (a mesma que me levará até Exu) quando novamente “deu o prego”, como se diz por aqui.
Beirando o meio-dia o novo pit stop foi ainda mais lento, mas o pior ainda estava por vir.

Após fazer todos os procedimentos, não consegui achar o adaptador necessário para encher essas drogas (rs) de câmaras de ar de pito fino. Vasculhei toda a terra em volta, olhei um milhão de vezes na pochete e nada.

Apesar da má fama e do medo que os próprios moradores da região gostam de propagar, é bom que se registre isso, várias pessoas que passavam pararam seus carros e, após ouvir a explicação do que estava acontecendo, ajudaram-me a esquadrinhar o chão.

Após muito tempo procurando, eis que chega a Super Tia Lalá. Entreguei a ela o pneu armado para que fosse encher em Serrita (8km à frente) e enquanto esperava ela voltar, continuei, sem sucesso, revirando o chão atrás do (grrrrr) adaptador de pito.


Somente às 14 horas, “estropiado, mas alegre o coração” por ter vencido mais um dia, finalmente cheguei à Capital do Vaqueiro.

Tia Lalá testemunha ocular da história - Clique para ver matéria

 Amanhã é dia de chegar a Exu. O pneu tá cheio, mas não encontrei um adaptador por aqui, então aceito rezas para afastamento de pregos no caminho.

Boa noite!

domingo, 9 de dezembro de 2012

INDO PARA EXU: DIA 5 - CHORROCHÓ / CABROBÓ (77KM)

Divisa BA/PE


Após ter passado todo o dia de ontem na estrada, o trecho a ser percorrido hoje foi propositadamente programado para funcionar como uma espécie de regenerativo. Desse jeito poderia acordar um pouco mais tarde e, mais que isso, desfrutar do café da manhã no Hotel antes de sair de Chorrochó.


Com pouco menos de 03 horas de pedalada, “sem rádio nem notícias das terras civilizadas”, já estava cruzando a ponte sobre o Rio São Francisco, marco da divisa entre Bahia e Pernambuco, que liga as duas Ibó (cidades vizinhas e homônimas).


Às 11:00 da manhã  chegava a Cabrobó.

No Hotel Limarques, primeira (e única) tentativa de hospedagem, funcionários vestidos de vaqueiro e um entalhe de Gonzagão na parede facilitaram minha tarefa de escolha.

com Ermilton
Estar em terras pernambucanas faz cair a ficha de que muito em breve estarei na terra do Rei do Baião realizando um sonho.

Por falar em terras pernambucanas, quem se juntou hoje definitivamente à expedição (após dirigir por mais de 300km) foi a destemida tia Lalá.


Boa semana!




sábado, 8 de dezembro de 2012

INDO PARA EXU: DIA 04 - EUCLIDES DA CUNHA / CHORROCHÓ (180KM)


Em frente à Igreja do Bonfim em  Chorrochó com Isabel Carvalho

"Ói eu aqui de novo".

Pedalar dois turnos poderia até ser considerado uma coisa cansativa, mas a alegria de voltar a Chorrochó dois meses após a Eleição, exatamente no dia que prometi aos meus amigos e colegas de trabalho, é algo que me deixa tão feliz e agradecido a Deus que não sobra espaço para outras sensações.

Às 5:20, deixando no Hotel a tia Lalá, que seguiria para Tucano para ficar com seus familiares, botei a bike na estrada.

Em Bendegó (62km à frente) dei uma parada e fui conferir o lanche de uma padaria que me fora indicada por um rapaz que conheci em Caldas do Jorro. Valeu a pena. Saí de lá parecendo que tinha tomado "Chá Cutuba".




Depois do lanche aumentei o ritmo e levei direto até chegar ao Povoado Caraíbas, onde parei para almoçar e conheci o caminhoneiro Jorge, que me recebeu com a seguinte exclamação:
- Você anda rápido nesta bicicletinha, hein!

Escolhera um restaurante-pousada pensando em negociar um quarto por umas três horas. A ideia era tomar banho, almoçar, dormir e, após baixar mais o sol, fazer os 50km restantes.

Deduzindo que o Jorge havia passado por mim, perguntei-lhe:
- Você passou por mim onde?

Lá se foi o plano da soneca. Conversamos animadamente até as 14:30, quando ele foi embora. Às 15:00 seria minha vez de seguir viagem.

Com Jorge em Caraíbas
Mais tarde ainda aconteceria outro episódio bem representativo da irmandade que há nas estradas. Uma carreta estava no acostamento e, no instante que começava a imprimir uma maior velocidade para ultrapassá-la, percebi o motorista do lado de fora me acenando com uma garrafa na mão. Detive a bike e descobri que ele havia parado ali apenas para me oferecer água gelada.


Estrada tem dessas coisas. 

Boa noite!