sexta-feira, 28 de outubro de 2016

100 KM DO FRIO (SOLO) - DE CARUARU A GARANHUNS - COM A ACORJA



Conciliar o treinamento para uma prova desta dimensão com a realização das Eleições para prefeito e vereador numa Zona Eleitoral crítica não foi tarefa das mais fáceis.

Equipe unida para realizar as Eleições de Santana e Canápolis
Uma das consequências foi a falta de tempo para registrar aqui no blog um tantão de coisas que aconteceram desde a última postagem. Além da comemoração da famosa dobradinha 10 anos de corrida e amor (vocês se salvaram desta - rs), foram diversos treinos intermunicipais tendo como base a cidade de Santana (Serra Dourada: 42km, Santa Maria da Vitória: 50km, Canápolis: 28km) e um treino de 08 horas realizado nos arredores da bela sede da 99ª Zona Eleitoral que,  por conta da tal conciliação, aconteceu entre 00:30 e 08:30 de um sábado pra domingo.

Um cansaço nunca antes sentido foi outro fruto da barra pesada enfrentada nestas Eleições 2016. Desta forma, imediatamente após meu retorno e a 15 dias dos 100 km do frio, cumpri com os amigos Regis e Pataro o último treino (de Salvador a Imbassaí - 67km ) antes de nossa prova alvo. Esgotado mentalmente, com o aval do Prof. Marcelo Augusti, optei por descansar também o corpo até o dia D.
 
Pataro e Régis ao final do treino Salvador - Imbassaí (67 km)
E chegou o dia...

O tempo, os companheiros de viagem, a perspectiva de rever amigos e participar da prova mais charmosa da ACORJA, e que é a verdadeira Comrades brasileira, tudo somado, cheguei a Caruaru, apesar de torta a coluna,  sentindo-me bem.

Como na corrida africana, a cada ano o sentido da prova é invertido (Garanhuns-Caruaru nos ímpares, Caruaru-Garanhuns nos pares), há inclusive a premiação especial "Back to Back" para os atletas que fazem os 100k solo em dois anos consecutivos.
 
Aline e "tia" Lalá indo espairecer em Caruaru na véspera da prova
Para tornar nossa missão mais fácil contaríamos com o auxílio mega-luxuoso da dupla Tia Lalá e Aline, divididas em dois carros abarrotados de água. 

Em sua quinta edição, o Desafio do Frio chegou a 226 atletas (30 solos, 12 duplas e 43 quartetos) oriundos do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Santa Catarina e Bahia.

A Largada dos Solos

A turma dos 100k full é a única que larga às 4 da manhã, o restante do grupo começa sua viagem somente às 6h. 

Como sempre o Presidente Lula Holanda deu show de vibração e, pontualmente, deu início à prova. Desejando boa sorte uns aos outros, deixamos a Faculdade Maurício de Nassau.

Antes de tomarmos a direção de Garanhuns, fizemos 02 quilômetros no sentido Maceió, justamente onde havíamos feito (Pataro e eu) uma "soltura" no dia anterior. 

Larguei num bloco intermediário e o primeiro quilômetro foi completado em 05'36. 

Naquele momento o grupo em que estava seguia guiado pelo facho de luz da lanterna de cabeça de André Burgos. Já começava a lamentar o desaparecimento da minha lanterninha quando Gilmar (que havia me dado uma carona até a largada) estendeu a mão e me entregou a danada que ficara em seu carro.

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André Burgos após dispensar lanterna 
Percebendo que estava tendo que mudar muito a passada, e de posse da minha própria "luzinha", não hesitei e, de forma natural, tomei a dianteira.

Na altura do km 6 fui alcançado por um corredor que, ao passar por mim, disparou o seguinte conselho: "campeão, essa sua batida de calcanhar no chão não está nada boa, tem que mudar isso aí". Com um sorriso nos lábios e achando que estava muito cedo para alguém começar a distribuir ensinamentos numa prova tão longa, aquiesci.

Mais tarde fiquei sabendo estórias de outros corredores que também receberam do simpático corredor ensinamentos diversos: trabalhe os braços, melhore a respiração, etc.


Rapidamente o dia clareou e, com certo espanto, verifiquei que a despeito de toda aquela "ladeirama" da saída de Caruaru, havia atingido os 12km antes de completar a primeira hora de corrida. Sem forçar a barra continuei naquele ritmo. 

É importante ressaltar que naquele momento corria  ainda sem a presença das nossas staffs. Munido de 800ml de água e 330ml de carboidrato (no meu caso) havíamos dado uma folga de 2 horas de sono para a dupla Tia Lalá e Aline.

Por volta do km 15, a primeira e sempre revigorante aparição. Gilmar, a bordo do seu possante encarnado, passou buzinando alegremente (só isso já valia meio pastel rs) mas acho que só para zoar ele resolveu encostar o carro lá na frente e, risonho, disparou-me a seguinte pergunta:

 - Cadê o cara que veio só para brincar? Não era só para completar?

Por conta dos últimos treinos, chegara pouco confiante na prova e a "Gigi"  revelara que a minha maior pretensão era apenas concluí-la.

- Estou feliz. - respondi-lhe. E acrescentei:
- O primeiro colocado disparou lá na frente.


No viaduto de São Caetano, novo encontro com Gilmar, que além de me presentear com um registro da sua lente, fez questão de me avisar que o corredor à frente havia passado há 20 minutos.

Enquanto contornava o viaduto para efetuar a mudança de BR tive o prazer de descobrir que Régis seguia logo atrás de mim.

Régis na mesma batida


Estávamos no km 23 - eu havia passado a marca da meia maratona com 1h e 44 - fiquei 
impressionado com aquela informação. Com toda aquela pirambeira, o corredor-conselheiro havia passado os 21k, aproximadamente com 1h e 24 min.

A placa do 25k surgiu linda à minha frente e o ritmo continuava tranquilo. A partir dali por algum tempo as subidas seriam bem suaves.

Pataro em sua passagem pelo km 25

No km 37 outra linda aparição: Tia Lalá.

Para tranquilizá-la pelo "atraso" (já estava correndo há mais de 3 horas) fui logo gritando que tudo  estava muito melhor do que havia pedido a Deus e que ela fosse "marcar" o corredor da frente para que eu soubesse como andava a diferença de tempo entre nós.

Alguns quilômetros à frente, chegando até a duvidar do que tinha ouvido realmente, recebi a noticia que ele estava com 9 minutos de dianteira e, à medida que avançava, a diferença só diminuía.

Havia completado a maratona em 3h 37 e estava me sentindo muito bem. Sabia que ainda faltava muito, não obstante, seguia agradecendo a Deus pela corrida que fazia. Lembrava sempre a frase do Mestre Carlinhos: "Se for para quebrar, que seja lá adiante", o mais perto do fim possível.

Correndo de forma absolutamente natural, sem preocupações com o relógio, apenas checava as passagens para ter certeza que estava indo bem. Consciente de que uma corrida longa é feita de altos e baixos e que o grande lance é sobreviver a estes e aproveitar aqueles, seguia cheio de energia, espantando (até que enfim!) o fantasma cansaço da eleição 2016.


Exatamente na metade da prova, a diferença para o primeiro colocado começou a ser apenas visual e pensei: agora vai.

Certamente alertado pelos seus staffs, o líder da prova começou a olhar para trás (o que sempre dá uma força extra para quem está na perseguição) e, quando viu que ia alcança-lo, virou-se de uma vez dando início a uma  breve conversa, em que fiquei sabendo que Miranildo (este era o nome dele) era de Maceió.

- Rapaz, estamos só nós dois aqui na frente, vamos nos ajudando.

- Beleza. - respondi-lhe.

Dividindo a liderança com Miranildo no km 52

Apesar da resposta positiva, internamente, devido à forma rápida como havia tirado a diferença entre nós dois, não acreditava que o Miranildo  fosse capaz de acompanhar o ritmo de 11km/h que eu estava desempenhando naquele momento.

Na hora em que nossos garmins registraram a primeira passagem de quilômetro juntos, ganhei de presente o segundo conselho do dia: "Rapaz este ritmo está completamente errado, você está muito forte".

Sorri, achando graça da "gaiva" de Miranildo, enquanto lhe dizia que "pretendia seguir naquela batida até onde fosse necessário administrar". Então, contrariando a lógica, o corredor ao meu lado começou a imprimir um ritmo ainda mais forte e, para meu total espanto, começou a abir distância lá na frente novamente. Não restava dúvida de que se tratava de um osso duro de roer.

As cidades foram se sucedendo e outra presença que fez toda a diferença no trajeto foi a do "pernambaiano" Almir Duarte, que volta e meia aparecia dando, além de informações sobre o panorama da disputa, aquele incentivo que todo corredor sabe bem quão importância tem nas missões mais difíceis. 



Com o "pacer" Almir Duarte


Sucediam-se também os quilômetros, 60, 70 e,lá na frente, impressionantemente Miranildo seguia mantendo uma pequena vantagem.

Por minha vez, já havia começado a alternar bons e maus momentos durante a prova. 

É sempre impressionante, mesmo para a gente que tanta vezes já vivenciou isso, como num momento você está morrendo e noutro, mais tarde, como por encanto, volta a correr com maior facilidade. Ressalto que aí não importa muito se é ladeira, se tá mais quente, etc. 

Sentir-se bem, muitas vezes, vale mais do que estar bem.

Gustavo Medeiros - 3º colocado geral
Já quase chegando na temida Jupi, pude ver no caminho evidências de que o líder da prova havia enfrentado problemas estomacais. A diferença voltava a cair e novamente Miranildo passara a olhar para trás amiúde. Agora vai, pensei novamente.




3 km de subida - chegando ao 78

Praticamente no mesmo momento em que pensei que ia assumir a dianteira, fui avisado que o terceiro lugar estava a poucos metros de mim. Sorri com meu botões (tanto trabalho e, ao que parecia, não iria poder nem curtir a liderança da prova novamente). Filosofia minha de corrida, não brigo contra quem vem de trás. Se chegou é porque está melhor, no máximo vou tentar acompanhar de longe para o caso de uma possível queda de rendimento do adversário  noutro momento.

E foi assim que, pouco depois do km 78, caí para terceiro lugar.

Durante a consistente ultrapassagem do atleta Israel Neto, ainda pudemos trocar umas palavras de incentivo mútuo, tendo inclusive lhe dito que fosse buscar o primeiro lugar.

Sabia que a chegada de mais um na briga ajudaria a mexer com o psicológico do líder da prova e aproveitei para pegar uma carona com aquele que logo mais passaria a lidera-la.

No km 80, a pouquíssimos metros de mim, MIranildo deitou-se no chão, bem na frente do seu carro de apoio. No mesmo instante em que ia passando pelo atleta que parecia estar com cãibras, tia Lalá parava o carro e ainda deu tempo de gritar-lhe  para que oferecesse à equipe alagoana o Cataflam que estava em nosso kit de primeiros socorros.

Voltava então à sina encarnada nesta edição dos 100km do Frio, a de perseguidor, tendo agora um líder diferente.

Em dado momento cheguei até a me empolgar com uma diminuída do Cel. Gomes Neto lá na frente. Notei que ele substituiu a camisa por uma branca e pensei: "Ou não está mais à vontade ou está tentando me confundir".

Qual nada. Nos sobes e desces da rodovia, o homem sumiu do meu campo de visão. Num dado momento cheguei mesmo a me espantar com a distância que havia imposto.


Altimetria da Prova
Menos esperançoso, busquei manter o melhor ritmo que podia, sempre na esperança de poder avistá-lo novamente, mas chegamos ao km 98 e nada, então resolvi pedir a "tia Lalá" que checasse a vantagem que tinha para o terceiro lugar. 

Tia Lalá voltou dizendo que o atleta potiguar Gustavo Medeiros estava a pouco mais de 1 quilômetro. Era hora de fazer os últimos esforços para administrar aquela posição em que praticamente havia estado a corrida inteira.

Quando fui entrando no cordão feito pelo exército (antes da descida final para o hotel) perguntei absolutamente feliz aos soldados há quanto tempo havia passado o primeiro colocado e ouvi um "mais de 20 minutos".

Incrédulo, retruquei: "Como?".

Lá embaixo, tia Lalá confirmava a informação: 27 minutos.

chegada ao lado da Tia Lalá
No meu fone de ouvido ecoava a canção "Tigresa". Nada mais apropriado para celebrar, agradecer e confessar que grande parte daquela "vitória" devia à "tia" Lalá, "uma mulher, uma beleza que me aconteceu".



Após 10 horas e 16 minutos de viagem, a festa precisava ser bem curta, nem tive tempo de encontrar o campeão para parabenizá-lo pela vitória, voamos para ir ajudar Aline que vinha se dividindo entre Régis e Pataro.




Já de carro, por volta do km 90 encontrei Régis, que acabou fechando a prova em 11h e 36 na sexta colocação geral.



Infelizmente (I), ficamos sabendo que o atleta Miranildo havia sido retirado do local de ambulância e não completara a prova, tendo inclusive sido transferido para um hospital onde permanecia até a publicação deste texto. Estamos torcendo pelo seu pronto restabelecimento.

Infelizmente II
Esquecendo-se de avisar aos organizadores e/ou amigos (regra que constava no regulamento), Pataro acabou desistindo da prova no km 67, o que causou uma grande apreensão até encontrá-lo, mas essa estória por si só já merece um post à parte.

Infelizmente III 
Por conta do "infelizmente" anterior acabei, novamente, não indo ao pódio geral. Tudo bem, nada que um lauto café da manhã não possa curar (rs).



No fim, o bom mesmo é que estávamos todos vivos e podendo, graças a Deus, voltar para nossas casas.

Pit stop no Jorro/Jorrinho para banho termal e um almoço na volta pra casa


Lula Holanda, organizando ou correndo, sempre distribuindo simpatia 

Gilmar Farias (responsável pela maioria das fotos aqui postadas, Pâmela (A Rainha) e Almir Duarte


















Flávio Rosal - 03 vezes consecutivas no 100 solo






















FOTOS DO COMEÇO DO MÊS DE OUTUBRO

Em Santa Maria da Vitória a caminho do Polo de Urnas com Aldair e Marcos Leite

Dia de Treino em Santana

Dia das Crianças na estrada com a gurizada




Levando a turma do trabalho para a corrida

Treino de 8h iniciado à meia noite e meia

Bom Jesus da Lapa